Transfigurar a velha fotografia esquecida. Sujeitar o referente adormecido a transformações escultóricas. Buscar, no desvanecimento da memória segregada às películas, novas possibilidades semânticas. No percurso deste trajeto, menosprezar a razão para que o caminho errático e labiríntico dos tantos acasos que a operação propicia dêem forma à intuição e à subjetividade do artista. No percurso do seu processo criativo, Davilym atenta contra originais fotográficos com produtos químicos que corroem de diferentes formas a película, para assim desestabilizar a ideia de memória como algo estático e perene no tempo. É fato, afinal, que a memória do passado ondula e se altera na soma dos dias tanto quanto o próprio homem. No laboratório experimental de Negative Experience o estável dá lugar ao vulnerável, a rigidez da forma ganha contornos imprecisos, o aparentemente real se transforma em fragmentos de um sonho que ressurgem após terem sido esquecidos.
Memória e ficção se irmanam nos negativos corrompidos e machucados que restam ao final deste processo corajoso e irreversível. Imagens que remetem a cenas míticas da infância, como as dos parques infantis, se mesclam a fragmentos de cenas vividas ou imaginadas na vida adulta, num fluxo narrativo intenso e não linear em que sonho, delírio, cenas de cinema e vida real ganham o mesmo status, a mesma tessitura. Esta narrativa transfigurada e recriada pela ação incisiva do artista traz à tona imagens de alto teor simbólico nas quais a faculdade da memória ressurge excitada por sensações intensas, genuínas. A função primordial do artista é a de se rebelar contra o comodismo dos arquivos para, enfim, representar de forma contundente os desejos e obsessões nem sempre visíveis que perpassam o roteiro de nossas vidas.
Eder Chiodetto, curador da exposição Negative Experience
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