Um dia será o mundo com sua impersonalidade soberba versus a minha extrema individualidade de pessoa mas seremos um só, 2016 Conceito do trabalho: O hibridismo entre corpo e natureza é a proposta dessa série, que busca entretecer as diversidades de significações, daí advindas, através de autorretratos e sobreposições imagéticas. A vegetação multiforme, presente como outro personagem, é aquela mesma - e simultaneamente diferente - que venho acompanhando, ao longo dos meses e anos, durante toda minha existência em suas diversas apresentações. Seus ciclos de germinação, morte, renascimento - e todo o processo sexual daí constitutivo - trespassa o corpo, o espelha e o fertiliza. E vice-versa. Esta série de autorretratos propõe evidenciar a relação corpo-natureza e auto-representação, no desafio de estabelecer resignificações de valores culturais insubmissos, no questionamento ao imobilismo identitário diante dos múltiplos e aumentados panoramas comunicacionais na cultura digital, infiltrar nos discursos críticos de gênero e nas diversidades de um eu que, assim como a natureza, está em constante fluxo. A proposição é de gestar e parir tais corpos multi-sexuais, hermafroditas, andróginos, indistintos - quanto à sua forma física e biológica - e vivos, que buscam apreender suas necessidades, autonomias e prazeres. Norteador do trabalho, o título da série é uma citação de Lóri, personagem do livro “Uma aprendizagem, ou o livro dos prazeres” de Clarice Lispector (1969).
Lóri encontra-se em processo de autoconhecimento não livre de angústias e dúvidas, intentando uma autoaceitação tanto de suas fragilidades quanto riquezas humanas que a possibilite finalmente a abrir-se ao mundo, ao outro, ao sexo, ao amor; onde cada sujeito aí envolvido é integro em si mesmo e autônomo do outro. Para ela, o mundo externo (tudo e todos) não a inclui, por isso a epifania da citação quando, pelo seu processo de aprendizagem, percebe-se de modo profundo conectada a essa teia misteriosa de relações humanas, afetivas e sensoriais. As sobreposições de imagens - autorretratos diluídos em formas outras ou a flora selvagem que compõe e transmuta feições humanas - não o fazem por inocência plástica. Cada elemento visual alí enquadrado discursa infinidade de palavras e leituras. O velar/desvelar da mulher se dá, simbolicamente, através das múltiplas sobreposições imagéticas - além do véu de noiva propriamente dito, que carrega sua evidente carga cultural - intenta propor reflexões e afirmar resistências, ou possibilitar visibilidades, de sua humanidade nas facetas que a inscrevem histórica- social e culturalmente. Esse novo ser afirma - e estende - sua condição de sujeito detentor de particularidades individuais que, vez ou outra, hibernam encasuladas para então transfigurar-se em algo além, tanto na forma quanto no lugar no qual a arte, com suas construções imagéticas detentoras de múltiplas leituras, possibilita o novo e o devir..
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